terça-feira, 16 de agosto de 2016

CERCEANDO DIREITOS

Quando os problemas começam na portaria da universidade: abuso de autoridade, homofobia e despreparo

'Superpoderes': Na Federal de Lavras, chefia de segurança e vigias atropelaram até recomendação do órgão máximo da instituição, que é presidido pelo reitor

No dia 5 de maio deste ano, o Conselho Universitário (CUNI), órgão máximo da Universidade Federal de Lavras (UFLA) e sob a presidência do reitor professor José Roberto Soares Scolforo, aprovou moção pública em que defende a irrestrita garantia de liberdade de expressão na instituição.

Os conselheiros consideraram as notícias de retrocessos institucionais vividos por outras comunidades universitárias e se manifestaram “para que sejam preservadas todas as garantias de liberdade acadêmica e de discussão ampla e irrestrita de todos os aspectos considerados relevantes pela comunidade universitária”. 

O documento ressalta ainda que a liberdade acadêmica e de discussão inclui ainda “os desdobramentos jurídicos, institucionais e políticas da conjuntura nacional; e que sejam repudiadas todas as formas de censura prévia, nos termos da lei”.

Apesar deste posicionamento do órgão responsável pela deliberação coletiva da instituição em matéria de administração financeira e política universitária, quando o assunto é a atuação dos vigias, subordinados a Coordenadoria de Vigilância Patrimonial (CVP) da universidade, as ‘leis e poderes’ são diferentes.

Em 22 de junho, universitários que compõem uma frente estudantil na instituição realizaram um ato em defesa da democracia na Cantina Central da instituição, com o consentimento da Pró-Reitoria de Extensão e Cultura (Proec), órgão responsável pela avaliação e apoio a eventos.

Em um determinado momento do evento, para surpresa dos organizadores e participantes, um grupo de vigias terceirizados, se aproximou de forma truculenta e ofensiva e iniciaram um episódio de desrespeito e afronta ao próprio posicionamento do CUNI. 


Acompanhados pelo servidor chefe de segurança da instituição, e alegando uma suposta denúncia feita por um docente em virtude do som, proferiram falas, muitas delas claramente demonstrando hostilidade ao caráter do evento.

Para a perplexidade dos presentes no local, um dos vigias sugeriu que há “limites” para o que ‘se pode ou não fazer’ dentro da Universidade Federal de Lavras e argumentou que “que está universidade não é tão pública como os estudantes pensam”.

Os estudantes e os presentes ainda tiveram que ouvir que atos que expressam as posições políticas não deveriam ser expressos na UFLA, sinalizando para uma orientação ideológica com o intuito de conter e cercear manifestações democráticas na universidade, ferindo o princípio constitucional da liberdade de expressão, defendido por unanimidade pelo próprio Conselho Universitário.

Após várias tentativas diálogo com a equipe de segurança, os universitários foram pressionados a encerrar o ato. Neste momento, outro abuso: enquanto um estudante falava sobre o respeito a democracia e encaminhava o evento para o seu fim, um dos vigias, que assim como os outros estava sem identificação no uniforme, desligou o microfone, cerceando a fala do estudante.

Polêmicas, abusos, afronta e despreparo não param por aí quando o assunto é a atuação do serviço de vigias. 

Muito antes deste episódio, a Universidade Federal de Lavras se viu numa grande polêmica sobre homofobia e que repercutiu em todo Brasil, causando revolta e preocupação na sociedade. 

E tudo começou na portaria da universidade, onde está instalada uma guarita sob a responsabilidade do CVP da UFLA. 

Um estudante da universidade foi impedido de entrar na instituição por estar trajando uma saia. 

Ação que partiu de um vigia gerou um grande constrangimento para o estudante e uma série de ações despreparadas tanto de vigias, do chefe de segurança e de um ex-funcionário do escalão da direção executiva à época, causou um grande alvoroço no campus. 

Durante o ato, o vigia se negou a se identificar, o que prejudicou o estudante na elaboração do Boletim de Ocorrências (B.O.) junto a Polícia Militar (PM). Os colegas do profissional se negaram também a informar o nome do vigia envolvido no caso.

A universidade nega até hoje que o fato fosse homofobia, mas a declaração do reitor José Roberto Soares Soares a uma grande emissora de televisão de iria implantar um ‘cadastro de saia’ para aqueles que se vestem “fora de um padrão”, chocou a comunidade acadêmica.

Na ocasião o dirigente disse que a abordagem do vigia ocorreu por que ele considerou que a vestimenta que do estudante “não era adequada”. Em virtude da grande repercussão gerada, no outro dia a instituição voltou atrás e disse que não iria implantar o cadastro.

Mas o que poucas pessoas sabem é que muito antes do fato envolvendo o estudante, outra saia foi alvo da mesma ação por parte dos vigias na portaria da UFLA. Um docente da universidade, que iria participar de um evento alusivo ao Dia Internacional da Mulher, ao adentrar no campus usando uma saia, passou pelo mesmo constrangimento na portaria. 

Na ocasião ele acabou não denunciando o fato e a situação só foi resolvido quando ele se apresentou como professor da Universidade Federal de Lavras.

Atuação e fiscalização
No total, a Universidade Federal de Lavras possui 44 postos de trabalhos de vigias, sendo 22 vigias diurnos e 22 vigias noturnos. Anteriormente, eles atuavam com contrato de trabalho de vigilantes, mas devido a restrições orçamentárias, a UFLA passou os trabalhadores do posto de vigilante para vigia. 

Com a medida, alguns optaram por não continuar atuando na instituição com este novo contrato de trabalho, uma vez que houve significativa redução salarial, bem como das atribuições da função. 

Procurada pela reportagem, a pró-reitora de Planejamento e Gestão (Proplag), Patrícia Maria Silva, disse que todos os contratos de prestação de serviço da universidade possuem três fiscais que acompanham o trabalho prestado. 

A Proplag é a pasta responsável pela Coordenadoria de Vigilância Patrimonial e pela gestão dos contratos e convênios da instituição.

Perguntada se a universidade possui uma política de orientação a estes profissionais quanto à questão da diversidade racial, cultural e de gênero, uma vez que na instituição circula uma população plural, a pró-reitora se limitou a dizer que todos os vigias são “devidamente treinados e orientados pela empresa prestadora do serviço e também por cursos específicos coordenados pela UFLA”.

A manifestação da pró-reitora é contestada na comunidade acadêmica. “São profissionais que se encontram desatualizados e com uma política de olhar o estudante como causador de problemas e desordem. A universidade vem se ampliando e com isso experimenta a vinda de pessoas de diversas culturas e gêneros. Não sentimos também abertura por parte da direção para tratar destes temas”, destaca um estudante da UFLA.

Para um docente consultado pela reportagem, atitudes como a ocorrida no ato cultural pela democracia, mostram essas deficiências. 

“Quando você tem um órgão superior defendendo a liberdade de expressão e manifestação e servidores cerceando isso, é porque existe no mínimo omissão de quem ter que ter autoridade para barrar estes atos”.

Ele afirma ainda que a universidade precisa ter um olhar interno para estas questões. 

“São fatos que poderiam ser facilmente evitados, mas que por falta de acompanhamento e fiscalização trazem constrangimento como estes ocorridos. Quantos outros fatos talvez nós não tenhamos conhecimento”.

8 comentários:

Anônimo disse...

eles vigiam é os hábitos e os costumes e não o patrimônio. é como no tempo antigo da "moral e bons costumes". vigia tá mandando mais que a direção aqui

Anônimo disse...

Este país realmente está uma bagunça. Ninguém é o obrigado a gostar dos hábitos e costumes dos outros, mas respeito sempre. Quando acontecem essas coisas em um lugar em que o respeito a diversidade deveria prevalecer, ainda mais institucionalmente, é porque realmente as coisas não vão bem. A Universidade não pode ficar em cima do muro diante de abusos como esses.

Anônimo disse...

esse pessoal tá mandando mais que o reitor e o conselho.

Anônimo disse...

Tem racismo também: quando eu era calouro e morava no brejão estavamos eu e um grupo de oito amigos assistindo filme no provisório e um dos guardinhas veio nos questionar o que estavamos fazendo, o engraçado é que ele foi direto no único amigo negro do grupo e o indagou como se ele devesse algo a alguém. Adoro essa universidade, uma das melhores do país, mas os guardinhas não estão aos pés dela. Não sabem ser cordiais, desconfiam de todos. Espero que scolforo dê possibilidade de formação pra esse pessoal.

Anônimo disse...

Se o Scolforo não tá dando conta de colocar ordem nos vigias acionem o Ministério Público.

Anônimo disse...


Os direitos humanos são fundados sobre o respeito pela dignidade e o valor de cada pessoa;

Os direitos humanos são universais, o que quer dizer que são aplicados de forma igual e sem discriminação a todas as pessoas;

Os direitos humanos são inalienáveis, e ninguém pode ser privado de seus direitos humanos; eles podem ser limitados em situações específicas. Por exemplo, o direito à liberdade pode ser restringido se uma pessoa é considerada culpada de um crime diante de um tribunal e com o devido processo legal;

Os direitos humanos são indivisíveis, inter-relacionados e interdependentes, já que é insuficiente respeitar alguns direitos humanos e outros não. Na prática, a violação de um direito vai afetar o respeito por muitos outros;

Todos os direitos humanos devem, portanto, ser vistos como de igual importância, sendo igualmente essencial respeitar a dignidade e o valor de cada pessoa.

Anônimo disse...

Isso tudo se deve ao fato de que muitos nesta Universidade acharem que podem tudo. É uma vergonha isso. Assim que são tratadas as pessoas. Agora todos estão vendo como funcionam as coisas. Direitos e poderes para um, punição e invisibilidade para outros.

Anônimo disse...

Pois eh!! Isso leva a uma reflexao muito profunda: por um lado, vigia nao pode fazer abordagem- de forma que se um mau elemento adentra o campus e ficam praticando delitos no campus, como vem ocorrendo ultimamente, fica por isso mesmo... mas vigia abordar cidadaos de bem que estao "na deles" usando saia e sem incomodar ninguem, ou cidadaos de bem que sao afrodescendentes e que estao ali pra estudar ou trabalhar honestamente,isso "pode", neh??? Que inversao de valores eh essa??? Humpf!!! :'(